Em que dimensão você vive? - Física


José Fernando Nandé



Lembro-me muito bem de certa noite do ano letivo de 1985 (preparávamos para a passagem do cometa de Halley, em fevereiro de 1986, quando cheguei até a passar por dificuldades para adquirir um pequeno telescópio). Nessa noite, a aula no Centro Politécnico da UFPR era de Geometria Analítica e Álgebra Linear, o quadro-negro estava lotado de equações derivadas e integrais para responder ao problema proposto: quantas dimensões existem? – Depois de três horas de formalismo matemático, chegamos à resposta teórica mais simples possível: “n”. Ora, em matemática o “n” quer dizer qualquer número imaginável, no caso, maior que zero e inteiro. Hoje, os físicos vislumbram de 9 a 11 dessas dimensões e nós, em nosso mundinho cúbico e euclidiano, nos acostumamos a viver com apenas três delas: extensão, profundidade e altura. E é desta maneira que boa parte das almas vê o mundo. Galileu Galilei (1564-1642), Isaac Newton (1643-1727) e todos os viventes que vieram depois deles até o início do século passado estavam presos nesta gaiola tridimensional do geômetra Euclides (360-295 a.C), que explicava com certa racionalidade e satisfatoriamente o mundo. Todas as verdades cabiam neste sistema espacial e por ele eram explicadas.

Felizmente, o espírito do homem não aceita verdades eternas, duvidou da verdade do quinto postulado de Euclides, aquele das retas paralelas, e elaborou as geometrias não-euclidianas, ponto de partida para Albert Einstein (1879-1955) desenvolver suas modernas teorias. A partir de Einstein ficamos sabendo que a matéria não passa de energia condensada e que o espaço tinha mais um companheiro, o tempo. Uma enorme mudança no nosso modo de ver o mundo, porque teríamos que aceitar coisas como o limite da velocidade da luz, o Universo curvo e paradoxos dos mais diversos, como o dos gêmeos, em que um deles, numa suposta viagem espacial, com velocidade bem próxima a da luz, simplesmente retornaria ao planeta mais novo do que o gêmeo que aqui ficou.

É evidente, que grande número de pessoas não consegue conjugar essa nova dimensão dentro do seu mundo conhecido e isso nos parece muito natural. Nesses não mais de 10 mil anos de processo de aquisição de conhecimento, em que desenvolvemos a escrita e deixamos de polir pedra para trabalhar com a eletrônica, somente na última centena de anos é que passamos a “treinar” para a percepção das quatro dimensões. Por milhares de anos, tudo em nós tem funcionado para o mundo cúbico. Nossos sentidos, por treino de gerações, só percebem a realidade objetiva tridimensional do instante a ser processado em nosso cérebro. Depois, o cérebro organiza essas percepções sensoriais, separa o que lhe parece útil, e as guarda naquilo que chamamos memória, que nada mais é do que um arquivo de instantâneos perceptivos não lineares, prontos para serem evocados a qualquer tempo. Ou seja, nosso treino nos ensinou a lidar relativamente bem com o que passou e com o que acontece no presente, porém ainda não nos ensinou a perceber o futuro, um dos componentes do tempo.


Representações 4D, notem que apenas acrescentamos mais um ponto aos tridimensionais
  
Ainda não compreendemos o tempo em todas as suas possibilidades, assim como o homem primitivo não compreendia as causas do raio e do trovão, somente seus efeitos geralmente nocivos para ele. Heródoto nos conta que havia um povo que atirava lanças contra as manifestações desses fenômenos meteorológicos, na vã tentativa de afastar deuses que os provocavam. E assim se dá por toda nossa história, tudo aquilo que não conseguimos entender é imediatamente encaminhado ao departamento do sobrenatural para ser alvejado pelas lanças do preconceito e incompreensão, para não dizer ignorância mesmo.

É de se imaginar como seria o mundo de hoje se algum feiticeiro, ao ver o fogo, tivesse dito aos de sua aldeia que era preciso explicá-lo para depois usá-lo. Certamente, ainda estaríamos polindo pedras em nossas cavernas sem saber que ali, numa inútil e proibida fogueira, tínhamos uma simples reação química combinando carbono com oxigênio. E é dessa forma que estamos lidando com os fenômenos premonitórios, desejamos uma explicação de causa e ignoramos seus efeitos e benefícios. Algo explicável até certo ponto, porque a Ciência ainda se prende ao cartesianismo causal, ao determinismo matemático e que, creio, deixaram esse mundo há muito tempo.

É sabido que utilizamos percentual mínimo da nossa capacidade cerebral (algo em torno de 10% a 20%), assim como é sabido que a natureza não costuma deixar espaços em branco nos organismos que se desenvolvem sobre o nosso planeta. No estudo da Evolução, verificamos que órgãos sem função ou utilidade são sacados dos organismos vivos. Então, é de se pensar a que, e para que, serve este grande vazio em nossos cérebros. Ora, o raciocínio em resposta nos parece lógico, já que utilizamos uma pequena parte dele na percepção do mundo tridimensional, o restante estaria disponível para diversas funções para as quais ainda não temos o entendimento perfeito – outras dimensões, por exemplo, ou a chamada Percepção Extrassensorial (ESP), do inglês Extrasensory Perception. Novamente apelo para o raciocínio lógico, quando aprendemos a falar e a escrever, o cérebro já estava preparado para isso, de tal sorte que, quando aprendermos a estabelecer contato com outras dimensões, o cérebro também estará preparado para tal.

Recentemente, a comunidade científica torceu o nariz para as pesquisas do renomado psicólogo e físico Daryl J. Bem (1938-) publicadas no Journal of Personality and Social Psychology e que aqui no Brasil mereceu matéria e chamada da capa da revista semanal “Isto-É”. Em sua pesquisa, Daryl relata nove experimentos feitos com mais de mil universitários e que comprovariam a existência do fenômeno ESP.

“Segundo Bem, em oito dos nove experimentos houve um índice de acerto acima do que é considerado coincidência ou obra do acaso. Também foi feito um teste no qual o aluno escolhia se queria arriscar mais nas respostas ou se desistia de tentar. ‘Os que aceitaram correr mais riscos foram os que tiveram mais acertos’, conta Bem. O psicólogo é cuidadoso ao tirar suas conclusões, mas acredita que todo mundo pode ter capacidades precognitivas, embora uns as tenham mais desenvolvidas do que outros. Também explica que as percepções extrassensoriais são frutos do processo evolutivo no qual antever situações de perigo ou propícias à reprodução se tornaram vantajosas ferramentas de sobrevivência. Isso ajudaria a comprovar a existência de premonições.” [Isto-É, 9/03/2011].

Como disse anteriormente, a sociedade científica ficou atônita diante das conclusões de Daryl J. Bem. Os questionamentos são vários: o método de aferição dos resultados; os instrumentos utilizados etc. Na realidade, os detratores de Daryl não se contentam somente em ver a ferida nas mãos do crucificado, eles desejam tocá-las. É como se um médico nos dissesse que estamos com febre e que ela existe de fato, mas o culpado pela febre seria o termômetro por estar mal ajustado e não a doença.

Aqui, ao finalizar este comentário, fico satisfeito em apenas ver de longe a ferida, sem querer por meus dedos nela. Para que bem me entendam, contento-me somente em aquentar-me ao lado da fogueira sem querer explicá-la. Dedico-me, portanto, aos efeitos e não às causas e deixarei aos que a isso não compreenderem, a liberdade de arremessarem suas lanças no raio e no trovão que os incomodam.

Tempo, esta é a chave para começar a entender os fenômenos precognitivos. Tempo, esta é a dimensão que ainda não entendemos em plenitude e em todas as suas possibilidades. É de se pensar que uma parte dos pretensamente sábios refuta o fenômeno precognitivo porque de antemão essa parte já se deu por vencida na total incompreensão do tempo. Esses pobres e infelizes de espírito são capazes de aceitar com uma fé cega e resignação bovina, as possibilidades científicas da viagem no tempo – para o passado e para o futuro – e igualmente, com a mesma facilidade, fé e resignação, são incapazes de entender as intuições que lhes chegam todos os dias depois de uma boa noite de sono.


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