CULTURA



Vinicius e Tom, a poesia e a música com todo o respeito



José Fernando Nandé

Vinicius e Tom Jobim, uma parceria que procurava não maltratar os versos nem a música
Gosto de efemérides, datas que são chamadas para a memória. Algumas não muito boas, outras ótimas em lembranças. Esta por exemplo, que aponta o aparecimento de Vinicius de Moraes. Ele nasceu no Rio de Janeiro, em 19 de outubro de 1913. Não vou focar este pequeno escrito na sua trajetória de vida, por demais conhecida e de fácil acesso em sítios especializados na internet. Pretendo aqui apenas destacar o perfeito casamento de sua poesia com a música.

Vinicius quebrou vários paradigmas musicais e poéticos ao colocar a poesia a serviço da boa música. De tal sorte, que a expressão letrista-compositor ganhou o mesmo status de poeta. Pois havia, e ainda há, um certo incômodo entre os poetas ao se rabiscar poemas e depois musicá-los. Parte desse incômodo se explica no modo de se fazer música, que pode ser a princípio de três formas - a partir da melodia, a partir da letra e ou na conjugação das duas primeiras num único ato, em que se reúne músico e o que faz a letra, a poesia propriamente dita.

No Brasil, a forma mais comum dentre as apresentadas é a da composição a partir da música o que, para alguns poetas, empobrece a poesia, porque são necessárias concessões líricas para satisfazer a melodia - como as rimas pobres, geralmente com verbos no infinitivo etc.

Pois bem, a sorte de Vinicius reside justamente no seu bom conhecimento musical e, principalmente, na capacidade de encontrar parceiros que compreendiam o fazer poético, além de serem excelentes músicos  e arranjadores.

Dentre as parcerias de Vinicius há de se destacar a que foi feita com o maestro Tom Jobim, que em depoimentos deixava claro que pelo menos uma vez colocou a melodia em segundo plano para não estragar o poema - caso do Soneto da Separação.

Outro feito notável de Tom, foi arranjar a Valsa de Eurídice -- poema que qualquer músico duvidaria que pudesse ser musicado, pois contém apenas quatro versos não metrificados e terminando com um simples adeus.

VALSA DE EURÍDICE

Oh, meu amado não parta
não parta de mim
Há uma ternura que não tem fim
Adeus

Letra aparentemente singela, em que se atribui a música também a Vinicius, mas que toma grandiosa forma na partitura de Tom e na bela interpretação de Paula Morelenbaum, em agudos 2 minutos e 14 segundos de gravação, no álbum Tom canta Vinicius.   


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A MULHER DO POETA


José Fernando Nandé



Dante viu somente duas vezes Beatriz em vida. 
Dante amou Beatriz e a transformou na musa da musas ao eternizá-la na Divina Comédia. Consta que o poeta a viu não mais do que duas vezes e dela não obteve palavra, somente um sorriso. Beatriz morreu jovem e Dante casou-se. Com o tempo, o poeta descobriu que havia escolhido mal, sua mulher tinha o comportamento vulgar e era o que hoje chamamos de fofoqueira. Assim, voltar para casa para ele tornou-se um martírio. A vingança de Dante, creio, foi nunca ter citado a megera em seus versos.
II
O poeta John Keats descrevia assim a paixão de sua curta vida, Fanny Brawne: "Carece de sentimentos em todos os traços (...) A boca é má e boa. Os braços são belos, as mãos um pouco feias e os pés toleráveis. Porém é ignorante, de conduta monstruosa (galinha), fugindo em todas as direções". Mas, Keats não deixou suas impressões sobre a moça depois de sua tragédia pessoal -- Miss Brawne, devotamente, cuidou dele por um tempo, antes de sua morte provocada pela tuberculose.
III
Realmente, um monstrinho que sabia ferir a alma alheia. Poeta satírico, Alexander Pope possuía os braços e as pernas como uma aranha, com peito de pomba e corcunda. Embora galanteador, bem resolvido financeiramente, o que é raro em poetas, Pope tinha dificuldades óbvias com as mulheres por sua triste figura. Apaixonou-se pela Lady Montagu, que o repeliu em escárnio e gargalhadas. Pope jamais a perdoaria e até o fim de sua vida atacou Montagu e seus amigos em versos terríveis. Pope não se casou, mas concedeu seu afeto à Marta Blount, amiga da juventude que, por piedade ou amor, desfrutou até o último dia a intimidade do poeta.
IV
A vida de Edgar Alan Poe foi tão espantosa quanto seus versos. Poe perdeu os pais, foi adotado por rica família e deserdado ainda na juventude, em função de seus vícios. Expulso desonrosamente da academia militar de West Point, não se firmando em emprego algum, casou-se com sua prima Virgínia de 13 anos. Bêbado, jogador e acusado de plágio, Alan Poe rolou definitivamente na sarjeta após vender os direitos de sua maior obra, "O Corvo", por apenas 10 dólares e perder a sua tão amada Virgínia em condições miseráveis. Ela rompera um vaso sanguíneo da garganta numa apresentação de canto e durante seis longos anos agonizou, lançando o poeta num mundo escuro e místico. Poe se entregou definitivamente à bebida e, em breves momentos de lucidez, chegou até mesmo a noivar com viúvas. Morreu num hospital, recitando apenas dois versos inteligíveis: O God!... Is all we see or seem/ But a dream within a dream? -- "Ó Deus!... Tudo que vemos ou julgamos ver/ Não passa de um sonho dentro de um sonho?".

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Dos Beatles ao bate-estaca - o ruído vendido como música e cultura



No dia 26 de setembro de 1969 era lançado o último álbum gravado em estúdio pelos Beatles, Abbey Road. Sim, os Beatles lançariam ainda Let It Be, oficialmente o último a chegar ao mercado, mas que foi gravado meses antes das sessões que deram origem a Abbey Road. Bom, isso é história para ser discutida em liturgia de boteco, para os que ainda têm fígado em pleno funcionamento, é claro! A pergunta é: o que veio depois, em qualidade, com alma, no mundo pop?

Respondo: pouco ou nada. Estão aí os shows e festivais nos mostrando o retorno dos velhinhos com suas guitarras e bengalas, que nos fazem crer que a boa música pop se esgotou no final da década de 1960, ou no início da década de 1970. Talvez, a efemeridade da música pouco criativa que se seguiu, também possa, e deve, ser explicada pela máquina de moer carne chamada "indústria cultural", ávida por novos produtos na prateleira, em velocidade digna do mundo industrial idealizado por Ford e, atualmente, aprimorado pelo Toytismo dos japoneses, ou à computadorizada indústria 4.0, presente em todas as fábricas do mundo da competição, em que a arte não é mais importante do que um parafuso.

Caminhou-se assim, até o nosso tempo, para o esgotamento do modo de fazer música em escala para o consumo, a tal ponto que essa própria indústria obrigou-se a "reciclar" antigos sucessos, pois nem ela aguentava mais tanta porcaria. É isso, porcaria forjada justamente na exploração da falta de cultura de seus consumidores, que adoram o ruído, o bate-estaca, com nome de música, em letras sofríveis e óbvias. Afinal, as variações de três acordes é limitada e até que durou muito. Na realidade, essa indústria tem uma única cultura traduzida no ganhar dinheiro, a pop grana, mais nada.

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